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O incognoscível
"A verdade é. Ela simplesmente é. Nada pode ser dito a
respeito dela. E tudo que puder ser dito a respeito dela irá
torná-la falsa.
Não há
necessidade de qualquer explicação. Não explicada,
completamente imediata, a verdade é. Ela circunda você. Ela
está dentro de você e sem você. Não há necessidade de se
chegar a qualquer conclusão a respeito dela. Ela já é
conclusiva! Você está nela.Você não consegue ser sem ela.
Não há maneira alguma de perdê-la. Não há maneira alguma de
se desviar dela. Você pode estar dormindo profundamente,
inconsciente, mas ainda assim você estará nela.
Assim, aqueles que conhecem a verdade sabem muito bem que a
filosofia não irá ajudar. Quanto mais você tentar conhecer a
respeito da verdade, mais você se tornará adormecido.O
próprio esforço para conhecer levará você a se perder. A
verdade pode ser sentida, mas não pode ser conhecida. Quando eu
digo que ela pode ser sentida, eu quero dizer que você pode
estar presente nela, que ela pode estar presente em você.
Existe uma possibilidade de um encontro. Existe uma
possibilidade de tornar-se um com ela. Mas não existe uma
maneira de se conhecê-la.
A verdade
não pode se tornar um objeto. Você não pode colocá-la ali e
vê-la. Você não pode segurá-la em suas mãos e vê-la. Você
não pode examiná-la externamente. Somente do lado de dentro,
somente tornando-se um com ela, você pode senti-la. Sentir é o
único conhecimento possível. Por isso, aqueles que conhecem
dizem: o amor é a maneira.
O
conhecimento é um tipo de ignorância. A palavra 'ignorância'
é muito bonita. Divida-a em duas e ela se torna 'ignor-ância'.
A verdade pode ser ignorada. Isso é o que ignorância é, de
outra forma, a verdade já está presente. Ignorância nada mais
é que ignorar a verdade que já está aí. E um homem de
conhecimento se torna mais ignorante, porque quanto mais ele
pensa que sabe, mais ele se torna capaz de ignorar aquilo que
é. Perdido em suas teorias, dogmas, credos e escrituras, ele
não tem mais olhos para ver a realidade. Perdido em palavras e
verbalizações, a sua visão está anuviada. Ele não consegue
ver aquilo que é.
Quanto
mais você estiver anuviado pelo seu pensar, quanto mais você
estiver na mente, mais você será capaz de ignorar a verdade. O
conhecimento não é necessário, mas apenas a inocência, a
inocência de uma criança. Vulnerável, aberto... Sem tentar
conhecer. No próprio esforço para conhecer você se torna um
voyeur. Você agrediu a realidade, você está tentando estuprar
a realidade.
É por
isso que eu continuamente digo que a ciência é um estupro da
realidade. A palavra 'ciência' vem de uma raiz que significa
'conhecer'. Ciência é conhecimento. Religião não é
conhecimento. Religião é amor.A palavra 'religião' vem de uma
raiz que significa comprometer-se, apaixonar-se, tornar-se um.
A verdade
é sentida. Ela é uma experiência vivida. Assim qualquer coisa
que puder ser dita a respeito da verdade, não será verdadeira.
Pelo simples fato de ter sido dita, ela já se torna não
verdadeira.
Tudo o
que já foi dito até agora e tudo o que vier a ser dito no
futuro, nada tem a ver com a verdade. Não há maneira alguma de
expressá-la. A verdade é muito arisca. Você não consegue
pegá-la em palavras. Você não consegue pegá-la através da
mente. A mente perde-a seguidamente, porque o próprio
funcionamento da mente é anti-verdade. O funcionamento da mente
é não-existencial. A mente funciona naquilo que não é, ou no
passado ou no futuro. O passado não existe mais e o futuro não
existe ainda. E a mente só funciona, ou no passado ou no
futuro. No presente existe a não-mente.
Se você
está no aqui e agora, de repente você terá se separado da
mente. Como você pode pensar aqui e agora? O pensar leva você
para longe do aqui e agora. Um simples pensamento e você já
estará a milhares de quilômetros longe do aqui e agora. No
aqui e agora não há qualquer possibilidade, não há qualquer
espaço para o pensamento surgir.
A mente funciona no
não-existencial, no fictício, no imaginário. A mente é uma
faculdade de sonhar, ela é uma faculdade de sonhos. A verdade
não é conhecida pela mente, é por isso que eu digo que ela
não é conhecida de jeito algum. A verdade é sentida pelo
coração, pela sua totalidade, por você, não pela sua
cabeça, por você enquanto uma unidade orgânica. Quando você
vier a conhecer a verdade, você a terá conhecido pela cabeça
e pelos dedos do pé; você a terá conhecido pelos ossos e
pelas suas entranhas; você a terá conhecido pelo seu coração
e pelo seu sangue; você a terá conhecido pelo seu respirar;
simplesmente pelo seu ser. A verdade é conhecida pelo ser.
Esse é o
significado quando eu digo que a verdade é sentida. Ela é uma
experiência. (........ )
Na
terminologia budista, 'Buda' é equivalente a 'verdade'. Eles
não falam muito a respeito da verdade. Eles falam muito mais a
respeito de Buda. Isso também é significante, porque quando
você se torna um Buda, a verdade é. E Buda significa que você
se tornou Acordado. Então, porque conversar a respeito da
verdade? Simplesmente pergunte o que é o acordar. Simplesmente
pergunte o que é consciência, porque quando você está
consciente, a verdade está ali. Quando você não está
consciente, a verdade não está ali.
Assim, a
pergunta básica e real é a respeito da consciência. Mas isso
também não pode ser perguntado e resolvido. A pessoa tem que
se tornar consciente, não existe outra maneira.
Um
discípulo perguntou a um mestre Zen: 'Se alguém me perguntar
daqui a cem anos o que eu penso ter sido a sua compreensão mais
profunda, o que eu deverei dizer?' O mestre respondeu: 'Diga a
ele que eu disse: é Isto!'
Agora,
que tipo de resposta é essa: 'é Isto!'? Ele indicou a
realidade imediata: Isto.
Vedanta,
o maior trabalho em Filosofia da Índia, fala a respeito do
'aquilo'. ... O povo Zen fala a respeito do 'isto'.
Certamente a compreensão deles é mais profunda, porque
'aquilo' está de novo no futuro, lá longe, enquanto 'isto' é
presente. Isto é aquilo. Esta margem é a outra margem. Esta
vida é a única vida e este momento é a eternidade.
Se você
puder viver este momento, se você puder estar
aqui neste momento, então tudo irá se arranjar
por si mesmo. Então você não precisa estar ansioso. Então
não há necessidade de perguntar. Antes que você pergunte, a
resposta já terá sido dada. A resposta sempre tem estado ali,
mas nós não estamos conscientes. Por isso, todo o esforço do
Zen é como trazer consciência para você.
É como se o
homem estivesse dormindo. O homem vive num estado de estupor:
ele se movimenta, trabalha, nasce, vive e morre, mas dormindo,
quase profundamente, roncando. A mente humana é burra. Mente é
burrice. A mente não tem qualquer inteligência em si. Nunca
houve uma mente inteligente. Eu não quero dizer que nunca houve
pessoas inteligentes, mas sim que nunca houve uma mente
inteligente. Inteligência é alguma coisa que vem quando a
mente é abandonada. A mente nunca é original, nunca é
radical. A mente sempre é ortodoxa. A mente sempre é
repetitiva, mecânica. Ela funciona como um robô. Ela segue
repetindo a mesma coisa por várias vezes. Ela é como um
computador: qualquer coisa que você lhe der para alimentar, ele
irá mastigar repetidas vezes.
Você já
observou a sua própria mente e o seu funcionamento? Nada de
novo acontece com ela. Nada de novo pode acontecer com ela. E
por causa disso você permanece alheio a tudo o que está
ocorrendo ao seu redor, você segue ignorando. Você está muito
apegado a esse instrumento medíocre e estúpido. Ela é boa
para ser usada; ela é boa como um reservatório, como memória;
ela é boa para manter registros. Mas esse não é o jeito de se
ver a realidade. Ela não tem olhos.
A mente
é cega como um morcego. Ela não tem olhos. A mente nunca pode
ser inteligente. Apenas a não-mente é inteligente. Apenas a
não-mente é original e radical. Apenas a não-mente é
revolucionária - revolução em ação.
Essa
mente dá a você um tipo de estupor. Carregada pelas memórias
do passado, carregada pelas projeções do futuro, você segue
vivendo no mínimo. Você não vive no máximo. A sua chama
permanece muito fraca. Uma vez que você começa a abandonar os
pensamentos e a poeira que você acumulou no passado, a chama se
levanta, limpa, clara, viva e renovada. Toda a sua vida se torna
uma chama, e uma chama sem qualquer fumaça. Consciência é
isso.
Consciência sem pensar: isso é consciência. Estar alerta e
sem qualquer pensamento. Tente isso! Sempre que você vir
pensamentos se reunindo, disperse-os. Puxe você mesmo para fora
disso. Olhe para as árvores sem qualquer tela de pensamento
entre você e as árvores. Ouça o gorjeio dos pássaros sem
qualquer gorjeio dentro da mente. Olhe para o sol nascente e
sinta dentro de você também um sol de consciência nascendo...
mas não pense sobre isso, não faça comentários,
declarações, não fale. Simplesmente esteja. E, pouco a pouco,
você vai começar a sentir vislumbres de consciência, súbitos
vislumbres de consciência, como se uma brisa fresca tivesse
entrado em seu quarto que estava ficando velho e morto; como se
um raio de luz tivesse entrado na noite escura de sua alma; como
se, de repente, a vida tivesse chamado você de volta.
Você já
ouviu a história de Lázaro. Conta-se que Lázaro morreu. Jesus
amava-o muito. Suas irmãs mandaram avisar Jesus. Com o tempo as
notícias alcançaram-no. Lázaro tinha morrido quatro dias
antes. Jesus veio correndo. Todo mundo estava chorando aos
prantos e ele disse: 'Não chore! Deixe-me chamá-lo de volta à
vida!'
Ninguém
podia acreditar nele. Lázaro estava morto. E as irmãs de
Lázaro diziam: 'Ele já está apodrecendo, ele não pode
voltar. Seu corpo está se deteriorando.'
Mas Jesus
foi ao túmulo onde o corpo estava sendo preservado até que ele
viesse. Puxaram a pedra para o lado e na caverna escura Jesus
chamou: 'Lázaro, levante-se'. E conta-se que ele se levantou.
Isso pode não
ter acontecido desse jeito. Isso pode ser apenas uma parábola,
mas é uma bela parábola a respeito do homem. Quando eu olho em
seus olhos, isso é tudo o que eu posso dizer: 'Lázaro,
levante-se'. Você está morto e apodrecendo. Você não está
mais vivo. Você teve um nascimento, mas você precisa renascer.
O seu primeiro nascimento não foi de muita ajuda. Ele o trouxe
a uma certa dimensão, mas isso não é o suficiente. Você tem
que ir um pouco mais. O nascimento que já aconteceu para você
foi apenas físico. Você precisa de um nascimento
espiritual. (...)
O primeiro
nascimento é apenas um nascimento físico. Não se satisfaça
com ele. Ele é necessário mas não suficiente. Um segundo
nascimento é necessário. O primeiro nascimento foi através de
seu pai e sua mãe. O segundo nascimento será a partir de sua
mente.Você tem que se separar da mente e esse será o seu
renascimento, você estará renascido.
E, pela
primeira vez, as árvores estarão mais verdes; estarão mais
verdes do que eram antes; as flores estarão mais lindas do que
eram antes; e a vida estará mais viva como você jamais a
conheceu, porque você só pode conhecer a vida dentro da
dimensão em que você estiver vivo. Você não pode conhecer a
vida se você não estiver vivo. Seja você o que for, você
conhecerá a vida somente dentro daquela sua dimensão.
A mente e
o controle da mente sobre você, são aprisionamentos. Livre-se
da mente. A questão não é como conhecer a verdade. A questão
é como ficar livre da mente; como livrar-se desse constante
ignorar, dessa ignorância; como estar simplesmente aqui,
despido, palpitando, jorrando, fluindo, transbordando e
encontrando a verdade que já está aí, que sempre esteve aí.
(...)
A
filosofia tenta explicar as coisas e nunca é bem sucedida. ...
A religião não faz qualquer esforço para explicar a vida. Ela
tenta vivê-la. A religião não considera a vida como um
problema para ser resolvido, mas um mistério a ser vivido. A
religião não é curiosa a respeito da vida. A religião está
num deslumbramento, num tremendo maravilhamento a respeito da
vida.
O nosso
simples estar aqui é um tal milagre... Não se pode explicar
porque eu estou aqui, porque você está aqui. Porque essas
árvores estão aqui, porque essas estrelas estão aqui. Porque
todo esse universo existe e segue povoando a si mesmo com
árvores, pássaros e pessoas. Porque originalmente ele está
aí, não há maneira alguma de se saber. Ele simplesmente está
aí. Mas ele inspira um deslumbramento! Ele preenche o coração
com um maravilhamento. Ele é inacreditavelmente verdadeiro, ele
é incrível! Ele é absurdo, mas tremendamente belo.
Não há
maneira alguma de se dizer porque ele está aí, mas ele está
aí. E a religião diz: Não desperdice seu tempo com os
porquês. Ele está aí: Curta-o! Celebre-o! Perca-se nele! E
deixe que ele se perca em você. Encontre-o! deixe que o
encontro seja como dois amantes entrando um no outro. Deixe que
isso seja uma experiência orgástica.
Mas a
religião no ocidente tem uma conotação muito errada.
Chegou-se a um ponto em que a própria palavra 'religião' cria
uma repulsa, em que a própria palavra 'religião' faz lembrar
igrejas mortas e padres mortos. Ela faz lembrar pessoas com
olhares sérios, rostos sisudos. Ela perdeu a capacidade de
dançar, de cantar, de celebrar. E quando uma religião perdeu a
capacidade de dançar, de celebrar, de cantar, de amar, de
simplesmente ser, então ela já não é mais religião, ela é
um cadáver, ela é teologia. Teologia é religião morta.
No
ocidente a teologia dominou a religião. Quando a teologia
domina a religião, então a religião nada mais é senão
filosofia. E uma filosofia que também não é muito
filosófica, porque a filosofia somente pode existir através
das dúvidas, e a teologia se baseia na fé. Assim, ela é uma
filosofia impotente, nem mesmo é uma filosofia no seu
verdadeiro sentido.
A
religião não é baseada em crenças ou fé. A religião é
baseada no deslumbramento, a religião é baseada no
maravilhamento. A religião é baseada no mistério que o
circunda. Para sentir isso, para estar consciente disso, para
ver isso, abra os seus olhos e abandone a poeira acumulado por
séculos. Limpe o seu espelho. Veja quanta beleza circunda
você. Veja a tremenda beleza que segue batendo em suas portas.
Por que você está sentado com os olhos fechados? Por que você
está sentado com esse rosto sisudo? Por que você não pode
dançar? E por que você não pode rir?
Nietzsche
está certo: Deus está morto... porque os teólogos O mataram.
Deus pode estar vivo somente quando um amante está dançando.
Mas quando um teólogo está tentando encontrar argumentos para
provar Deus, Ele está morto. Deus está vivo quando duas
pessoas se apaixonam, então Deus está palpitando e saltitando.
Deus está vivo quando você olha para uma flor e você não
consegue se mover diante dela, alguma coisa o domina e o
emociona. Quando você olha para as estrelas e você se torna um
com o mistério, e o seu barco começa a velejar em direção à
outra margem, então Deus está vivo. Quando você canta uma
canção, ela pode ser sem significado, ela pode ser um simples
lá-lá-lá, ela pode não ter qualquer sentido, mas Deus está
vivo naquela pura expressão de alegria.
Deus
está vivo quando você está vivo. Se você não está vivo,
como pode o seu Deus estar vivo? O seu Deus é seu. Se você
está morto, o seu Deus está morto; se você está vivo, o seu
Deus está vivo. O seu Deus não pode ser maior do que você,
porque o seu Deus é o centro mais profundo do seu ser. Assim,
se você quiser saber o que é Deus, torne-se mais vivo. Se
você quiser saber o que é Deus, torne-se mais divino. Se você
quiser saber o que é Deus, então não tente saber, tente
sentir. Ele chega através da porta do coração.
Deus é
um tal mistério, ou chame isso de vida, ou existência. A vida
é um tal mistério que mesmo se você entrar no santuário mais
interno dela, você não será capaz de acreditar. Ela é
inacreditavelmente verdadeira. Ela é Incrível. (...)
Sim, a
vida é um mistério, e nada há para se explicar, porque tudo
está simplesmente aberto, ela está exatamente diante de você.
Enfrente-a! Encontre-a! Seja corajoso! Esse é o ponto de vista
do Zen. (...)" |